Fiscal e Tributário

Contador terá que reportar irregularidade a partir do ano que vem

Marcos Perillo Marcos Perillo | Atualizado em: 07/07/2023 | 7 mins de leitura | ← voltar

Contador registra aviso de irregularidade fiscal

A relação da sua empresa com o contador pode mudar no próximo ano. Novas regras devem entrar em vigor no Brasil, prevendo o aviso de irregularidade fiscal às autoridades. Mas quem faz tudo certo e segue a lei não tem com o que se preocupar. O risco está nas falhas de gestão, ainda que não intencionais.

Entenda o aviso de irregularidade fiscal

Você já leu aqui no blog que a auditoria contábil pode identificar falhas no controle financeiro e também fraudes e irregularidades na gestão. Quando isso acontece, pelas regras atuais, o profissional que é contratado para essa análise deve comunicar ao administrador e não a terceiros. Caso atinja o nível gerencial, pode optar por renunciar à tarefa, mas até nesse caso não deve levar o problema para além dos muros da empresa.

Em 2017, mudanças devem atingir não apenas o trabalho de auditores independentes como também de profissionais contratados por empresas para cuidar da sua contabilidade. Na prática, cai o sigilo profissional que impedia a comunicação externa de irregularidades. Não que as finanças empresariais irão se tornar públicas, mas surge a obrigação de reportar o não cumprimento da lei às autoridades competentes.

Como principal novidade, essa espécie de denúncia caberá não apenas à figura do auditor, quando existente, mas também ao próprio contador, que deverá analisar o caso sempre que algo na gestão fiscal e tributária destoar dos regulamentos, ainda que não se trate de conduta intencional.

Se você ligou a medida ao atual momento de combate à corrupção no país, não fez uma relação equivocada. Mas a norma em questão é internacional: trata-se da nova edição da chamada Noclar, sigla em inglês para Obrigatoriedade de Reporte do Não-cumprimento à Leis e Regulações.

O tema vem sendo discutido nos últimos anos em consultas públicas e assembleias promovidas pelo Conselho Internacional de Ética para Contadores e Auditores (Iesba). Por aqui, a versão em português vem sendo construída pelo Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), com previsão de lançamento em julho de 2017.

Ao portal da entidade, o seu diretor técnico, Rogério Garcia, declarou que espera ganhos importantes para a sociedade com essa nova norma de ética. “Contadores e auditores têm muito a contribuir para que tenhamos um país mais transparente”, disse.

Então, para quem é empreendedor, vale conhecer o que muda na regras e, se for o caso, aproveitar essa chance de ouro para adequar definitivamente à lei todos os processos contábeis na empresa.

O que muda no código de ética contábil

Não são apenas os contadores que devem ficar atento às mudanças nos procedimentos éticos de sua atuação. Quem tem uma empresa precisa se preparar, pois, dependendo da gravidade da infração cometida, não ficará livre de ser denunciado por aquele que tenta orientá-lo a adotar as melhores práticas de contabilidade e gestão.

O texto da norma original, já publicada no idioma inglês vem sendo traduzido pelo Ibracon. Para você ir se preparando, adiantaremos agora alguns dos principais pontos abordados.

O que pode ser denunciado?

Contadores e auditores devem observar possíveis ações que infringem a legislação contábil já cometidos ou prestes a serem cometidos. A Noclar fala em atos de omissão, intencionais ou não, contrários aos regulamentos existentes, de responsabilidade de um cliente ou de seus funcionários.

Nem todo ato irregular será imediatamente denunciado às autoridades competentes. A norma prioriza o combate a operações consideradas graves, incluindo fraude, corrupção, suborno e lavagem de dinheiro, além daquelas que atinjam a proteção ambiental, a saúde e a segurança pública.

Como o contador irá agir?

O empreendedor não deve ver o contador como um inimigo na trincheira, especialmente partindo daquele velho ditado: quem não deve, não teme. Mas como falhas podem ocorrer de forma não intencional, é natural que haja preocupação. Ainda assim, tenha calma, pois não há garantia de denúncia externa.

A norma prevê que o contador deve se certificar detalhadamente sobre a situação, examinar o que vem sendo feito de forma irregular ou fraudulenta e, com todas as informações e documentos em mãos, conversar com o responsável imediatamente superior à área da empresa na qual o problema foi detectado.

Na realidade de uma micro ou pequena empresa, é provável que o próprio dono do negócio seja abordado. Ainda assim, o contato será preventivo, com o objetivo inicial de retificar, remediar ou mitigar as consequências da falha.

O contador pode obter aconselhamento jurídico de um advogado ou orientações de uma auditoria externa antes de qualquer ação, além de consultar um órgão regulador ou entidade de classe em caráter confidencial.

Ele também deve avaliar se aceita substituir um colega ou iniciar relação com um cliente específico, caso isso represente ameaça ao cumprimento dos princípios fundamentais, havendo envolvimento em atividades ilegais, desonestidade ou outro comportamento antiético. Além de recusar a tarefa, pode romper a relação profissional com uma empresa já em atendimento.

Quando a denúncia ultrapassa os limites da empresa?

A quebra do sigilo profissional, ou seja, a divulgação externa das irregularidades na empresa, deve ocorrer se houver previsão em regulamento ou quando for considerado assunto de interesse público, desde que não haja proibição legal. O propósito é permitir que a autoridade informada possa investigar a questão.

Conforme a Noclar, essa divulgação depende da natureza da irregularidade e da extensão do prejuízo real por ela provocado sobre investidores, credores e trabalhadores. É o caso, por exemplo, de um cliente cuja licença para operar seja ameaçada pela sua conduta, quando ele é cotado em bolsa de valores e o caso possa representar risco ao mercado ou quando há ameaça potencial ou real à integridade física do contador e de outras pessoas.

Qual autoridade será avisada da irregularidade?

A norma prevê que a autoridade escolhida seja capaz de receber as informações e fazer com que o assunto seja investigado e medidas cabíveis tomadas. A escolha dependerá da natureza do caso. No Brasil, por exemplo, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) deverá ser indicado quando o assunto tratar de suspeitas vinculadas à lavagem de dinheiro.

O que está previsto de forma bem clara é que a divulgação pelo contador ou auditor à autoridade competente não será mais considerada uma violação do dever de confidencialidade. Ainda assim, cabe ao profissional agir de boa fé e ter cuidado ao fazer declarações e afirmações, avaliando se deve ou não avisar o cliente antes de fazer a denúncia.

Siga a lei e previna problemas

Aos poucos, o Brasil vai tendo na Operação Lava-Jato uma amostra de que a corrupção não vale a pena. Mas infelizmente esse não é um crime restrito às instituições públicas e muitos empreendedores ainda praticam algum tipo de “jeitinho” para sonegar impostos ou mesmo promover o chamado Caixa 2.

Se a prática fraudulenta já era totalmente desaconselhável, a partir do próximo ano, há uma chance ainda maior de insucesso: aquele que mais de perto acompanha a sua gestão poderá denunciar suas irregularidades.

Ainda que elas não sejam intencionais, como vimos neste artigo, seu comportamento equivocado poderá resultar em problemas junto aos órgãos de fiscalização. Por isso, se informe, estude, qualifique processos e converse com seu contador para que nada ocorra à margem da lei. Nenhum desvio do tipo vale a pena.

 

O que você achou da novidade quanto ao aviso de irregularidade fiscal nas empresas? Comente!

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